Após a reforma trabalhista e a decisão do STF muitas empresas estão optando por contratar pessoas jurídicas ao invés de admitirem novos funcionários (regime da CLT).
Todavia, embora esta prática seja utilizada legalmente por muitos empresários, há que se ter em mente que deve haver uma razão para esta utilização, uma mudança na empresa, uma reformulação ou reorganização, enfim, há que se demonstrar o motivo da alteração na forma de contratação, que não apenas a redução dos encargos trabalhistas, sob pena de multas e autos de infração por parte do Ministério Público do Trabalho.
Isto porque o advento da terceirização da atividade versa tão somente sobre a licitude de se transferir parte da atividade – fim ou meio – de uma empresa para outra empresa, seja em virtude da redução de custos, da eficiência, da especialização ou de outros interesses empresariais.
Dito sob outro giro verbal, enquanto na terceirização, seja da atividade meio ou da atividade fim, encontra-se amplamente configurada a licitude, na “pejotização” o mesmo não ocorre.
Em sendo assim, permanece ainda vigente e usual a interpretação dada por vários juízes do trabalho acerca da simulação da constituição da pessoa jurídica quando realizada apenas para se afastar a incidência de tributos e de obrigações estipuladas pela CLT.
Consigne-se que a contratação lícita de uma terceirizada pressupõe que a prestadora de serviços é quem irá contratar, remunerar e dirigir a atividade de seus trabalhadores (terceirizados) e, não, a tomadora dos serviços. Por oportuno, quando a tomadora dos serviços é quem dirige a atividade dos terceirizados incide ainda a hipótese específica do instituto da “contratação de empresa de trabalho temporário” disposta no art. 4º da Lei nº 6.019/1974, circunstância que implica na limitação temporal desta prática por 180 dias prorrogáveis por mais 90.
Para trazer à baila uma posição mais objetiva, é necessário investigar os fundamentos utilizados pelo Fisco para concluir que houve “pejotização”. Da análise do relatório emitido pela Receita Federal do Brasil surgem duas situações, que podem ser cumulativas ou não.
A primeira situação se verifica quando o Fisco afirma que a utilização da pessoa jurídica foi utilizada para substituir/mascarar um contrato de trabalho. Nesse caso, estariam presentes, no “mundo dos fatos”, os requisitos previstos na legislação trabalhista para o reconhecimento do vínculo de emprego com o consequente efeito tributário.
A segunda situação ocorre quando o Fisco suscita a figura da “pessoa jurídica inexistente de fato”. Atualmente, existe previsão na legislação a respeito das situações (bem imprecisas, aliás) que configuram a “inexistência de fato” de pessoa jurídica. Nessa hipótese, o efeito da “pejotização” poderia ocorrer ainda que não estivessem presentes os requisitos para caracterizar o vínculo de emprego. Ora, se a pessoa jurídica “inexiste de fato”, restaria a pessoa física e o consequente efeito tributário.
Percebam a diferença. No primeiro caso, dissimula-se o contrato de trabalho. No segundo, a dissimulação é a prestação de serviço de uma pessoa física, ou, em outras palavras, a simulação é da própria pessoa jurídica.
O problema com essa interpretação do Fisco é que a atual legislação sobre a terceirização expressamente prescreve que não se configura vínculo de emprego entre os empregados ou sócios da pessoa jurídica contratada e a empresa contratante. Em outras palavras, a lei reconhece que a relação jurídica de trabalho entre as citadas pessoas não existe, mas, conforme tem-se notícia, a Receita Federal, até início de 2019, fez 498 autuações relacionadas ao tema da “pejotização”. As autuações representam R$ 567 milhões em cobrança.
Após várias pesquisas, conclui-se que a possibilidade de contratação de trabalhadores como “pessoa jurídica” é expressamente vedada conforme o art. 9º da Consolidação das Leis do Trabalho que considera nulos todos os ajustes que visem afastar a aplicação da legislação trabalhista, quando presentes os requisitos da relação de emprego (arts. 2º e 3º, CLT).
Assim, para que a “pejotização” possa ocorrer sem riscos, a empresa deve afastar todas as características fundamentais da relação de emprego: pessoalidade, subordinação, continuidade e exclusividade.
Igualmente, a própria reforma trabalhista visa claramente coibir a precarização das relações de emprego por meio do fenômeno da “pejotização” ao, por exemplo, impor a quarentena de dezoito meses para a recontratação de trabalhadores via prestação de serviços, seja como sócios das contratadas ou como empregados da prestadora.
Vale por fim ressaltar um último ponto prático de atenção: a emissão sequencial de notas com mesmos valores, local fixo de trabalho e até o e-mail vinculado à empresa são indícios utilizados pelos juízes para avaliar, quando da abertura de um processo, se o vínculo contratual, na verdade, caracteriza uma relação empregatícia.
Diante dos fatos acima expostos, a “pejotização” pode ser utilizada apenas se forem respeitadas todas as restrições elencadas, sob pena de autuação por parte do Fisco.
Martha Deliberador Mickosz Lukin
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